sábado, 26 de outubro de 2013


Temos vindo a divulgar a colaboração estabelecida entre a designer parisiense Isabel Marant e a marca sueca H&M. Já vos mostrámos algumas fotografias do lookbook e um editorial que saiu na Vogue russa. Agora, chega a altura de falarmos um pouco mais aprofundadamente sobre esta parceria. Existem alguns aspectos que são de pertinente discussão e que podem, e devem, ser debatidos.

Soube da parceria estabelecida através da newsletter do Fashionista que costumo receber no meu e-mail. Na altura, franzi logo o sobrolho. O artigo em questão dizia respeito a 23 imagens da campanha publicitária que tinham sido divulgadas na Internet antes do previsto. Sim, isto pode acontecer... É verdade... Mas logo 23 foi demasiado suspeito.

Praticamente toda a campanha foi divulgada e, se foi assim tão antes do previsto, porque é que imediatamente a seguir começaram a surgir os vídeos, imagens promocionais e editoriais? Não me parece que tenha sido um acidente, mas sim uma forma de chamar a atenção camuflada em jeito de erro quando, na realidade, mais aparentou ser uma estratégia de marketing. Do género: "Oh não, escapou-me! Soubeste antes de toda a gente..."; Realidade: soubemos todos ao mesmo tempo, não vale a pena sentirmo-nos especiais.

Bom, mas isso é o mal menor. A indústria não vive sem mercado e, para o haver, é preciso existirem formas de o controlar para o levar a fazer aquilo que se quer. Uns, mais ingénuos, deixam-se enganar. Outros, vendo o que se passa, vão fechando os olhos... E alguns simplesmente repugnam tudo isto. Eu sou o último caso.

Neste sentido, o que vos trago aqui hoje é uma reflexão relativamente à qualidade e originalidade das peças resultantes desta colaboração. A reflexão justifica-se por vários motivos. Por isso, decidi enumerá-los em 6 pontos principais.

  1. A maioria dos artigos desenvolvidos não irão funcionar num público mais alargado, pois todos eles aparentam ser demasiado model off the runway, funcionando num tipo de corpo muito específico, corpo esse que está longe de se inserir dentro dos parâmetros do target da H&M que, independentemente da colaboração, se mantém sempre o mesmo: as massas, principalmente as jovens/jovens-adultas.

  2. A designer Isabel Marant foi escolhida apenas pelo sucesso dos ténis que tanto ficaram famosos junto de muitos jovens e jovens-adultos. É neste ponto que se prende também a acção do marketing. Aproveitou-se esse facto para fazer uma colecção que praticamente todo o target da H&M vai querer ter apenas por conhecer o nome da designer devido aos famosos ténis. Pais, preparem a carteira para os presentes de Natal.

  3. A falta de criatividade e de originalidade é perfeitamente condenável. Vendo a situação objectivamente e sem estratégias associadas, as roupas não têm nada de especial e parecem ser de uma colecção regular da H&M, enquanto olhando para as peças resultantes da colaboração com a Versace - que serve aqui apenas como exemplo - se via claramente quem tinha desenhado essa colecção. Não me parece que, pessoalmente, vá fazer o esforço de comprar peças mais caras, relativamente ao preço habitual da H&M, para obter roupas que parecem exactamente de colecções normais da marca e não resultantes de uma colaboração.

  4. O que mais me perturba é a reedição de peças de colecções antigas. Isabel Marant decidiu reinventar - no caso de algumas peças é mais auto-copiar - os seus maiores sucessos dos últimos anos, apresentados em nome próprio, nas semanas da moda de Paris. Como exemplos, temos as botas com franjas e o casaco bordado, ambos apresentados na colecção Outono-Inverno 2011. E, tal como estes, existem outros exemplos... Temos também o caso de um casaco de missangas encarnadas, apresentado na estação Primavera-Verão 2012. Por um lado, percebe-se que, desta forma, as peças estarão mais acessíveis a outro tipo de público. Mas, por outro, tal facto torna as peças icónicas muito menos especiais, pois são feitas para a produção em massa e com materiais muito menos nobres, perdendo, assim, qualidade e design. Funcionando numa lógica de contrafacção, é quase como ir comprar réplicas a feiras, com a diferença de que estas foram feitas pela própria designer.

  5. O objectivo destas colaborações é trazer algo de novo, exclusivo e nunca antes visto. Não faz sentido criar peças iguais tanto para um high-end market, como para o low-end. No final de contas, quem sofre com isto é o próprio designer, pois os revendedores de high-end perderão o interesse, visto já não existir o carisma e exclusividade que outrora existia. Qual seria o revendedor interessado em ter na sua loja um casaco Isabel Marant igual a um casaco feito para uma colaboração com outra loja? Simples: nenhum.

  6. A grande questão é estar a oferecer ao público peças mais caras, comparativamente às colecções-tipo H&M, assinadas por uma designer, que não funcionam na maior parte das pessoas nem são nada de especial. E eu, devido ao ódio que tenho em tomarem as pessoas como estúpidas, sinto-me um bocado ofendida, principalmente, por a colecção ir sair no dia do meu aniversário. Se tivessem escolhido outro dia não me importava nada. Mas, por favor, não me roubem o dia para tentar enganar as pessoas.

H&M; Outono-Inverno 2012

Marta F. Cardoso

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